Conteúdo atualizado há 12 anos
Hoje reli uma coluna bem legal em uma revista que me deixa muita saudade, pois não é mais publicada. É triste ver que veículos que dedicam-se tanto aos leitores não conseguem patrocínio suficiente (não tenho certeza se foi esta a razão). Até o site da revista saiu do ar. De qualquer maneira, o conteúdo deles era muito caprichado e bem feito, dava gosto de observar os detalhes de cada página.
O artigo fala sobre os direitos de autoria sobre as imagens. O que sempre gera bastante discussão, afinal os bancos de imagens que temos por aí publicam as fotografias como se tivessem sido feitas por “macacos treinados” e sem nome. Enfim, leia porque vale a pena!
As minhas, as suas, as nossas fotos
por José Roberto Comodo Filho
Desde tempos imamoriais, quando se começou a cogitar a necessidade de proteção ao “gênio criativo”, debatem-se as questões relacionadas a quem efetivamente detém o direito autoral moral sobre determinada obra. E as linhas que escrevo convidam você, leitor, a refletir sobre esta questão: quem é o criador de determinada foto e que merece receber o crédito autoral?
O direito patrimonial dificilmente gera complicações, pois costuma ser objeto de contratos bem elaborados, que definem quanto cada pessoa que trabalhou na realização do projeto receberá. Passando isso para a fotografia, equivale dizer que os assistentes de estúdio, a produtora, o maquiador, a modelo, a pessoa do Photoshop, todos sabem quanto vão ganhar. Entretanto, o problema surge quando algum desses “colaboradores” decide pleitar a participação como autor do resultado final, desejando ver seus créditos inseridos ao lado da imagem. Que fazer?
Essa questão, que sempre foi tratada de forma muito reservada nos bastidores da arte, acabou vindo à tona de forma inesperada, em 2004, quando um dos mais festejados prêmios de fotografia brasileira deu espaço para um debate sem precedentes sobre o papel do manipulador digital no resultado final da fotografia. E a consequência mais visível foi a modificação das regras do concurso para os anos seguintes. Refiro-me ao Prêmio Conrado Wessel de 2004 e da fotografia “Irado” (acima).
Não vamos, aqui, polemizar a decisão do jurí nem questionar o trabalho do talentoso Ricardo Cunha. Mas o fato é que devemos encarar a existência de um problema cada vez mais presente nos estúdios dos fotógrafos em tempos de tecnologia digital. A solução não é difícil e decorre da própria leitura da Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98), quando afirma no Art. 7º: “São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro (…)”.
Em outras palavras, é absolutamente possível um manipulador digital exigir que determinada foto – por ele tratada, mas não fotografada, – leve o crédito autoral. Mas, para que isso aconteça, é preciso que ele tenha colaborado criativamente para o resultado final. Ou seja, não basta ajustar o balanço de branco, acertar o brilho, contraste e nitidez para pretender abocanhar a co-autoria.
E, mesmo nas situações de intervenção digital mais complexas, é preciso que analisemos se o resultado final foi fruto de um operador de Photoshop que apenas seguiu as ordens que recebeu ou se ele foi além, colocando a sua própria criatividade para gerar algo novo. Os desdobramentos desse tema são muitos e bastante complexos. Por esse motivo, é impossível esgotá-lo neste espaço. Mas acredito que a nossa função não seja apenas dar respostas, e sim apontar direções e convidar à reflexão.
Nesse sentido, de convidar à reflexão, gostaria de ver você refletindo sobre a seguinte questão: a praxe do mercado publicitário é, nos anúncios baseados em fotografias (e a maioria o é), raramente (quase nunca, para dizer a verdade) inserir o crédito autoral com o nome do fotógrafo responsável pelo clique. Nas poucas vezes em que o nome do fotógrafo é colocado, deve à sua notoriedade, que certamente ajudará a valorizar a própria peça publicitária.
Esse fato deve ser atribuido a quê? Por acaso o “criador” seria o publicitário que passou a orientação para o fotógrafo, que passa então a condição de mero apertador de botão? Ou essa praxe de mercado é ilegal e somente acontece por um desvio de conduta daqueles que deveriam lutar pelos próprios direitos – os fotógrafos?
Vá pensando nisso… mas tenha em mente que a lei, textualmente, obriga a inclusão do nome do autor sempre que uma obra for utilizada para qualquer finalidade. E, para terminar, autor é sempre pessoa física, por isso é ilegal atribuir determinada criação – uma fotografia, uma escultura ou uma peça publicitária – a uma pessoa jurídica, seja ela um banco de dados, uma agência de publicidade, seja um órgão público.
Pense nisso… E lute por seus direitos!
José Roberto Comodo Filho é advogado formado pela USP há 15 anos e fotógrafo amador há 12 anos. Foi professor universitário e especializou-se em Direito do Autor, Contrato e Uso da Imagem.
Fonte: Revista Fotógraphos / Nº 11 – Março / Abril de 2007