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O livro A Câmera de Pandora (2013), do autor Joan Fontcuberta, é uma coleção de textos que, unidos, proporcionam uma reflexão interessante a respeito da transição da fotografia para a tecnologia digital. Confesso que comprei o livro por ser muito bonito (impressão perfeita e capa dura), mas também gostei muito do conteúdo!
Fontcuberta constrói um panorama sobre a fotografia, desde a argêntica até a digital. No início havia grande dificuldade de manipular as fotos, era preciso ter muitos equipamentos e profissionais para conseguir o efeito desejado. A tecnologia digital chegou para facilitar todo esse processo, além de permitir grande distribuição, agora é impossível evitar a disseminação da informação visual.
“A história da fotografia pode ser entendida como o percurso que vai do objeto à informação, ou seja, como um processo de desmaterialização crescente dos suportes. O daguerreotipo como ponto de partida das imagens produzidas por uma câmera era tanto uma imagem fixada em uma chapa quanto uma chapa que continha uma imagem: seu luxo material era inevitável. Do ostensivo e pesado daguerreotipo à suave abstração de um ordenamento de algoritmos, as fotos foram metal, vidro, papel, filme e finalmente presença volátil no ciberespaço.”
É a imaterialidade da tecnologia digital que permite maior interação coletiva, já que a fotografia deixou de ser apenas uma representação da realidade para permitir uma verdadeira construção de sentidos.
Mas quais sentidos estão sendo construídos atualmente? A fotografia é um suporte poderoso, todos podem registrar imagens do jeito que desejar na hora em que quiser. Por conta disso o autor revela que a maior parte dos ‘fotógrafos’ ativos são os jovens, mas o foco não é a produção de documentos (como fazíamos ao fotografar apenas ocasiões especiais). Nesse cenário, a fotografia hoje é uma ferramenta de autoafirmação, em que é necessário registrar tudo o que te faz parecer do jeito que você deseja ser.
Esse panorama construído pelo autor, tecendo comparações entre a fotografia argêntica e a digital, serve para, no fim, perceber que ainda estamos vivendo em um período de transição; ninguém sabe aonde isso tudo vai dar. O momento é uma verdadeira mistura de empolgação tecnológica com uma saudade do passado, de coisas que talvez nunca mais possamos usufruir.
“Alguns fotógrafos elogiam a técnica digital porque com ela seu trabalho não depende da sorte, Mas podemos refutar esse argumento: o inconsciente do olhar que surrealistas tanto valoraram na câmera fica desativado pelo excesso de controle e de racionalidade. Toda inovação nos obriga a discernir entre perdas e ganhos. Certamente desejamos que as vantagens superem com folga os inconvenientes, mas, como elas aparecem imediatamente como promessas de felicidade, só o sedimento da experiência desvelará quais são os efeitos colaterais e a que nos obrigou a renunciar.”
Resumindo, tudo no mundo já foi fotografado, a criatividade pode sofrer consequências graves nesse cenário onde o mais importante é fazer registros. É preciso reconhecer que, hoje, as imagens estão a serviço de uma reflexão sobre a memória. É necessário lembrar, com urgência que a câmera pode ser uma máquina, mas o fotógrafo não precisa ser um robô.
E você, acha que o meio digital pode prejudicar a criatividade?
SOBRE O LIVRO Título: A Câmera de Pandora |