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Otto Stupakoff – o primeiro fotógrafo de moda do Brasil

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Conteúdo atualizado há 11 anos

Há duas razões para eu ter feito mais um post sobre fotografia de moda. A primeira é que está rolando uma das semanas de moda mais badalas do país (SPFW) e a segunda é que começou uma exposição que apresenta 70 fotografias clicadas pelo primeiro fotógrafo de moda do Brasil. O trabalho de Otto Stupakoff foi escolhido para inaugurar o Centro de Arte Contemporânea e Fotografia, que fica na Av. Afonso Pena, 737 – Centro, até o dia 21 de março de 2010.

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Otto sofria de alzheimer e faleceu na madrugada de 22 de abril de 2009. Ele pôde conferir esta exposição de homenagem ao seu trabalho, nos seus dois último meses de vida, enquanto estava no Rio de Janeiro. Começou sua carreira como fotógrafo ainda jovem quando, aos 22 anos, abriu um estúdio em São Paulo em 1957, logo depois de voltar de uma viagem de estudos em Los Angeles, no Art Center College of Design. Sua tragetória profissional começou direto na fotografia de moda e publicidade, mas também realizou trabalhos importantes no fotojornalismo.

Em uma entrevista dada ao jornal A Gazeta, Otto contou detalhadamente como realizou a primeira fotografia de moda no país, em 1958, com a ajuda do estilista Dener Pamplona, de um amigo no Rio de Janeiro e de sua então namorada, a atriz Duda Cavalcanti, primeira garota de Ipanema:

“Jamais havia visto uma foto de moda publicada no Brasil, antes de eu fazer a primeira. É incrível, porque já éramos uns 100 milhões de habitantes. Pedi ao Dener um vestido emprestado. Coloquei na mala, peguei um ônibus para o Rio de Janeiro, combinei com minha namorada, Duda Cavalcanti, e fomos para a casa do Heitor dos Prazeres, amigo pintor e sambista, que morava numa casa art noveau. Nesse terraço, coloquei Duda com o vestido do Dener, que ele havia feito, em 1955. Era um vestido branco e azul-marinho. Nesse dia, no terraço da casa do Heitor, a Duda vestindo Dener, foi feita a primeira foto de moda no Brasil. Essa foto, que fiz para mim, nunca foi publicada”.

Com muito talento e dedicação, Otto Stupakoff conquistou um grande espaço na área, realizando trabalhos para grandes revistas (Vogue, Harper’s Bazaar, Cosmopolitan, Elle, Esquire etc.) e fotografando grandes personagens e celebridades (Truman Capote, o ex-presidente dos EUA Richard Nixon – foto abaixo -, Grace Kelly, Jack Nicholson, Paul Newman, Sophia Loren, Jorge Amado, Antonio Carlos Jobim, Pelé, Kate Moss etc).

Richard Nixon e sua filha Julie na Casa Branca, em foto de Otto Stupakoff de 1971
Richard Nixon e sua filha Julie na Casa Branca, em foto de Otto Stupakoff de 1971

Seu trabalho deve ser mais do que reconhecido e apreciado, já que ele foi o único profissional brasileiro a ter seu nome incluído no Vogue Book of Fashion Photography, ganhando destaque entre os dez nomes mais importantes da fotografia de moda do mundo, nos anos 70. Portanto é uma exposição que vale a pena conferir!

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Imagem de ensaio para a revista "Mit", anunciado por Stupakoff em 2008 como o último editorial de moda de sua carreira

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Em 2005, Otto deu uma entrevista ao UOL, quando estava sendo homenageado no SPFW, veja abaixo um trecho e, se desejar, leia na íntegra, clicando aqui.

UOL: Qual o seu ideal de fotografia de moda?
Stupakoff: Sempre tratei o retrato de moda como uma foto familiar. Sou fotógrafo de moda que tem ojeriza a fotos posadas. Sempre tentei que as modelos fossem o mais descontraídas possível, que fossem atrizes, que pudessem viver a situação com a qual elas se deparariam na locação.

Uma das melhores experiências nesse aspecto são as fotos que fiz da hoje atriz Jennifer Connely (N.R.: de “Uma Mente Brilhante”, “Requiem Para um Sonho”, “Hulk” e “Labirinto”). Eu a fotografei desde os 11 anos, quando começou a carreira de modelo infantil. De início, conheci a mãe dela e propus para que fossem ao sul da França, onde morava, para que a garota fosse retratada. E ela inventava tudo por conta própria nas sessões, foi lindo.

O maior desafio do artista é o de encontrar sua própria voz. Gosto de evitar coisas já feitas. Comparo aquele momento de início de carreira ao de alguém que se depara com uma floresta densa, escura, amedontradora, e onde você encontra uma abertura que tem uma trilha, já pisada. Você pode pegar a trilha que quiser. Mas digo que procurem a brecha mais escura, onde não tem trilha nenhuma, para achar seu próprio caminho. Senão não vai conseguir realizar o seu ideal.

Ao adentrar o lugar escuro, vai ver que ele não é tão escuro quanto se pensava, que o salto do abismo não é tão grande, e que o dragão que se esconde na caverna não será um devorador, mas sim a pérola do seu estilo pessoal. Isso leva um certo tempo, faz parte da evolução e da necessidade de honestidade por parte do fotógrafo.

Assim, você separa os fotógrafos em duas categorias: aquele que vive o glamour e ganha a vida profissionalmente, mas que não são profundamente dedicados à verdade de sua prática _e pra mim não dá para mentir para mim mesmo. Não queria virar um homem rico que desprezasse a si mesmo. E há outro tipo de fotógrafo, para quem a fotografia é uma maneira de viver, para qual ele está dedicado.

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UOL: O que acha da fotografia de moda hoje?
Stupakoff: Tenho a impressão que, se eu recomeçasse a fotografar moda, se me fosse dada a oportunidade, começaria de onde parei, porque até hoje não vi ninguém fazendo o que eu imaginava.

Em primeiro lugar, existe uma quantidade de fotógrafos que não existia antigamente. Na década de 50, eram cinquenta, no máximo. E hoje são muitos, muitos, e eu vejo nomes que nunca vi antes e não me interessa fazer trabalho de pesquisa para saber quem é quem. Hoje não estou procurando acompanhar esse mercado, há muitas revistas, e os nomes que vejo mudam constantemente. Eu tenho a impressão de que não está sendo dada ao fotógrafo a oportunidade de desenvolver o seu olhar, a sua maneira de ver. No tempo que trabalhei, você facilmente poderia trabalhar uma década, ou mais, e ver o quanto seu trabalho se desenvolveu nesse aspecto, admiro imensamente o trabalho de Helmut Newton e a maneira como ele se renovava constantemente.

Um jornaleiro de Nova York, especializado em revistas antigas, já me contou do número de jovens fotógrafos que compravam as Vogues de 20, 30 anos atrás, por altos valores, para se inspirar naquela trilha que já estava aberta e pisada. Há exceções, mas não em número suficiente para serem lembradas.

Como tudo, as coisas não são levadas tão a sério quanto antigamente. Talvez seja nostalgia minha, mas gostaria de retornar à identidade própria e à seriedade do trabalho. Hoje há muitos aproveitadores e o espaço que é dado a eles escancara a incompetência daqueles que dirigem revistas do gênero.

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